uma casa vazia
uma piramide de garrafas se erguendo na parede
o cinzeiro cheio de pontas apagadas e fósforos queimados e números de telefone
uma peça de roupa que a garota de programa anunciada no jornal esqueceu porque a gente de tão solitário quando achou que nunca mais seria solitário lhe pediu que esquecesse
o acúmulo de caixas com tarjas pretas e nomes estranhos e um sono químico sob o som do Bach mais incompreensível
um álbum de retratos em que todas as fotografias sejam do passado remoto e não existem mais fotografias recentes
pacotes abertos de preservativos e preservativos usados
vômito alcoólico criando vida na pia suja
a luz a água e o telefone cortados
pornografia coberta por teias de esperma cobertas de poeira
relógios enguiçados sob a mesma essa poeira que também se estende sobre a porta e o ferrolho
a consciência de que isso não é nada bonito nem agradável e muito menos revolucionário
os livros que jamais serão lidos
as páginas em branco amarelecendo vazias como velhas virgens
os poemas que se escreveram e não há mais a vontade de correr atrás de uma publicação
as cartas que a gente escreveu e sabia que não ia mandar
porque todos os poemas são como cartas
porque todas as cartas são como poemas
e eu nunca esqueço que vou morrer
e escrever sobre isso não me faz sentir melhor
Nenhum comentário:
Postar um comentário