quarta-feira, 25 de março de 2009

A UM POEMA QUE SE CHAMARIA SOLUÇÃO QUE SE EXISTISSE SERIA ESSE MESMO

uma casa vazia

uma piramide de garrafas se erguendo na parede

o cinzeiro cheio de pontas apagadas e fósforos queimados e números de telefone

uma peça de roupa que a garota de programa anunciada no jornal esqueceu porque a gente de tão solitário quando achou que nunca mais seria solitário lhe pediu que esquecesse

o acúmulo de caixas com tarjas pretas e nomes estranhos e um sono químico sob o som do Bach mais incompreensível

um álbum de retratos em que todas as fotografias sejam do passado remoto e não existem mais fotografias recentes

pacotes abertos de preservativos e preservativos usados

vômito alcoólico criando vida na pia suja

a luz a água e o telefone cortados

pornografia coberta por teias de esperma cobertas de poeira

relógios enguiçados sob a mesma essa poeira que também se estende sobre a porta e o ferrolho

a consciência de que isso não é nada bonito nem agradável e muito menos revolucionário

os livros que jamais serão lidos

as páginas em branco amarelecendo vazias como velhas virgens

os poemas que se escreveram e não há mais a vontade de correr atrás de uma publicação

as cartas que a gente escreveu e sabia que não ia mandar


porque todos os poemas são como cartas

porque todas as cartas são como poemas


e eu nunca esqueço que vou morrer

e escrever sobre isso não me faz sentir melhor